O tesouro que Delfim deixou para a FEA

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Enviado por mayra.onishi em sex, 06/10/2023 - 14:42

São mais de 100 mil títulos que compõem o acervo riquíssimo da Biblioteca Delfim Netto, colecionados ao longo de quase 8 décadas pelo professor emérito. Para marcar o início das comemorações dos 10 anos da biblioteca, a diretoria da FEA inaugurou uma exposição com obras raras do acervo, tendo como tema principal a história do pensamento econômico.

 

Uma das 66 bibliotecas da USP, a Biblioteca Delfim Netto é um tesouro riquíssimo em livros raros, enciclopédias, coleções, artigos, revistas e compêndios colecionados pelo professor emérito da FEA ao longo de toda a sua vida acadêmica e profissional. São mais de 100 mil títulos das mais várias áreas do conhecimento, que abrangem um período de quase meio século. Apesar de ser economista, Antonio Delfim Netto tinha uma sede incansável pelo saber e buscava respostas para os questionamentos da humanidade em todas as áreas das ciências humanas. Seu olhar aguçado descobriu obras raríssimas pelas livrarias e sebos ao redor do mundo, as quais foi reunindo em seu acervo particular por quase 8 décadas.

Hoje, esse acervo faz parte da Biblioteca FEAUSP. Há quase 10 anos, o professor Delfim Netto decidiu doar o conjunto total de livros que colecionara para a instituição onde graduou-se em Ciências Econômicas em 1951 e onde lecionou por vários anos. Em 2014, foi inaugurado o novo prédio da Biblioteca FEAUSP e, dentro dele, a Biblioteca Delfim Netto, que duplicou o volume de títulos da biblioteca original da FEA. A Biblioteca Delfim Netto é considerada o mais completo acervo de livros de economia do Brasil e temas relacionados à área econômica. Mas as obras ali contidas vão além dessa temática, com livros sobre história, antropologia, sociologia, filosofia, tecnologia, meio ambiente, entre outros assuntos específicos.

Para marcar o início das comemorações dos 10 anos da Biblioteca Delfim Netto, a serem completados em 2024, a diretoria da FEA inaugurou no dia 22 de setembro uma exposição de parte do acervo no hall da Biblioteca FEAUSP, denominada "Uma viagem pela história do pensamento econômico – A biblioteca de Delfim Netto". Em 12 vitrines separadas por temas, a exposição reúne 150 livros dos mais variados períodos e autores. Ela foi montada de forma que o visitante possa percorrer a história do pensamento econômico como um "roteiro de estudos". A curadoria é de responsabilidade do grupo de pesquisa Hermes & Clio, com o patrocínio da Fipe, através do Fundo Patrimonial FEAUSP, e das empresas Cacique, PremieRpet® e DGF Investimentos.

Com a presença da filha do professor Delfim Netto, Fabiana Netto, e inúmeros convidados – entre eles antigos colegas do departamento de Economia da época em que Delfim lecionava, como o professor José Pastore e Manuel Enriquez Garcia – a inauguração da exposição transformou-se numa homenagem ao professor emérito, não só pela doação de seu acervo particular de livros que enriqueceu sobremaneira as estantes da Biblioteca FEAUSP, mas também por tudo que o economista representa para história da Faculdade e para o ensino do pensamento econômico no país.

“Tesouro intelectual”

“Damos inícios às comemorações dos 10 anos da doação e do acesso público a esse tesouro intelectual da FEAUSP. Essa exposição não apenas representa um marco significativo ao reconhecer e enaltecer o acervo meticulosamente construído pelo professor Delfim ao longo de mais de 8 décadas, mas também abre novos horizontes para a Biblioteca da FEAUSP. Este espaço se configura como um ponto de encontro entre a comunidade acadêmica e a sociedade em geral, oferecendo oportunidades para a exploração de novos temas, ideias e obras. Cada livro exposto se transforma em uma janela que nos permite vislumbrar a história, a cultura e os avanços que moldaram a evolução do pensamento econômico”, disse a diretora da FEA Maria Dolores Montoya Diaz ao abrir a cerimônia de inauguração da exposição.

 

 

 

 

“Doação superlativa”

Um dos responsáveis pela curadoria da exposição, o professor de História Econômica da FEA Alexandre Macchione Saes destacou que a doação do professor Delfim Netto foi “superlativa nos diversos sentidos”. Segundo ele, são cerca de 100 mil livros, 90 mil periódicos e outras centenas de milhares de artigos reunidos em compêndios organizados em volumes temáticos por Delfim Netto que formam, como afirma seu doador, uma biblioteca de estudo. Na área de economia, completou Saes, dificilmente encontraremos uma biblioteca tão completa e tão atualizada como essa na América Latina.

Alexandre Saes destacou a importância de exposições como essa para a difusão do conhecimento e o encantamento de pesquisadores. “A exposição pode se transformar numa porta de entrada para novos leitores e pesquisas no acervo. Com isso as bibliotecas assumem papel ativo no diálogo com o público, reiterando sua vocação de preservação do conhecimento, mas também fomentando novos olhares, desvendando temas esquecidos ou negligenciados que essas coleções podem iluminar e ampliar o alcance de análise”.

Saes agradeceu a confiança da diretoria da FEA concedida aos professores do grupo Hermes & Clio que se debruçaram sobre o acervo e definiram quais obras fariam parte da exposição. Citou os professores Ivan Salomão, Guilherme Grandi, Luciana Galvão, Herick Soares e Fábio Esperança. Para a execução do projeto, o grupo contou com o apoio de Hálida Fernandes, diretora da Biblioteca FEAUSP, assim como Sandra La Farina e Angélica Suemitsu, responsáveis pela Biblioteca Delfim Netto. O professor agradeceu, ainda, Luiz Eduardo Frin, Eduardo Giannetti da Fonseca e Laura Valadão de Matos, cujas entrevistas e conversas foram fundamentais para o grupo aprofundar o conhecimento sobre a coleção.

“Caráter plural do acervo”

Representando o professor Delfim Netto, o ex-aluno de Administração da FEA e doutor em Artes Cênicas, Luiz Eduardo Frin, afirmou que o acervo doado por Delfim à FEAUSP e à toda a população é resultado de um trabalho “meticuloso e disciplinado” e “atesta a busca de um homem pelo conhecimento, o que fica claro pelo caráter plural do acervo, que é múltiplo, contraditório, e não se prende a convicções ou ideologias”. Frin trabalhou por muitos anos com o professor Delfim e colaborou com a transição do acervo particular do economista para a FEAUSP.

Segundo ele, a biblioteca foi construída “para ser o grande subsídio para dar respostas apropriadas aos problemas enfrentados pelos homens e pelas sociedades, principalmente os problemas enfrentados pela sociedade brasileira”. Ela ilustra claramente a concepção do professor de que a Economia é uma ciência humana na máxima complexidade do conceito. Por isso, a compreensão da economia, mesmo que parcial, passa pela abordagem social, política, filosófica, matemática, física natural, psicológica, antropológica e artística.

Luiz Eduardo Frin afirmou que o acervo está em constante expansão, mesmo com as restrições impostas pela idade (o professor Delfim está com 95 anos), ou seja, o professor continua doando livros à biblioteca até os dias de hoje. Ele definiu Delfim Netto como um “homem público que, concorde ou não com suas proposições e decisões, sempre procurou fundamentá-las em vasto material referencial, como atesta seu acervo e seus grifos na maioria dos livros, artigos e revistas” que compõem a Biblioteca Delfim Netto.

“Exímio comprador de livros”

Um dos últimos a falar, o economista, ex-professor da FEAUSP e membro da Academia Brasileira, Eduardo Gianneti da Fonseca frisou que a Biblioteca Delfim Netto não é uma biblioteca de “bibliófilo”. “O que interessa para o professor Delfim não é a primeira edição, não é o livro raro, não é o autógrafo, não é sequer o manuscrito. A Biblioteca Delfim Netto é uma biblioteca de pesquisa, é um instrumento incomparável de trabalho para quem busca conhecimento na área de humanas”.

Giannetti relatou que Delfim era um “exímio” comprador de livros, porque ele entendia qual era a edição certa para se adquirir de um determinado autor ou clássico. “Esses grandes clássicos da filosofia, da economia, das ciências, têm milhares de edições que vêm sendo publicadas em séculos. O Delfim sabia exatamente qual era a edição definitiva que era obrigatória ter numa boa biblioteca de pesquisa. E essa biblioteca tem essas edições”.

Uma das coisas que mais chamou a atenção do economista quando visitou pela primeira vez o acervo particular do professor Delfim, na Granja Viana, foi a imensidade dos temas, especialmente filosofia, que é sua grande paixão e área pela qual se aprofundou. “Cheguei lá achando que fosse uma biblioteca de Economia. A minha grande surpresa é que a economia, de fato, é uma parte restrita dessa biblioteca. Na verdade, é uma biblioteca de história, de ciências, de filosofia. A biblioteca possui uma ampla abrangência na sua capacidade de refletir a produção universal do conhecimento pelo homem”.

Após os discursos da cerimônia de abertura, que contou ainda com falas da diretora da Biblioteca FEAUSP, Hálida Fernandes, do presidente da FIPE, Carlos Antonio Luque, e dos representantes das empresas patrocinadoras, a filha do professor Delfim Netto, Fabiana Netto, descerrou a cortina da exposição ao lado da diretora da FEA Maria Dolores Montoya Diaz. A cerimônia teve a presença do secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Samuel Kinoshita, do secretário de Justiça e Cidadania, Fábio Prieto, e do pró-reitor e pró-reitor adjunto de Pesquisa e Inovação da USP, Paulo Alberto Nussenzveig e Raúl Gonzalez Lima, respectivamente.

 

Autora: Cacilda Luna